Arcádia Lusitana - Livro de memórias em estilhaços
"Um dia o coração explodiu-me nas mãos como uma bomba"
Tuesday, January 04, 2022
Ninguém
Eu sou ninguém. Eu não sou ninguém. Não quero ser ninguém. Quero existir em paz. Quero paz. E não encontro ninguém. Não me encontro. Não sei quem sou. Estou amarrado à vida e não me perguntaram se eu queria existir. Eu só queria viver. Ser uma árvore ou uma flor, não ter outra existência que a da seiva que corre, do sangue que flui, do vento que passa, da água que canta na fonte.
Tuesday, July 15, 2014
É a que nunca teve sorte e tinha um grande amor que merecia a felicidade. Divaga entre as searas, pó de oiro, de verde, de poalha de sol, com reflexos na água de um tanque onde caiu uma rosa. As raparigas que vêm do trabalho são fortes, sadias e cantam uma clara canção que um poeta do campo e um músico da cidade compuseram. Ela é preguiça da felicidade, ondulação da poeira, feliz resíduo da alegria que paira impalpável, feliz por pairar, feliz por se depositar em qualquer canto, feliz por viver num sono móvel que um canto de pássaro ou um raio de sol acorda, esquecimento, esquecimento.
António Ramos Rosa, Círculo Aberto, Ed. Caminho, 1979.
António Ramos Rosa, Círculo Aberto, Ed. Caminho, 1979.
Monday, July 07, 2014
Declinar a Ocidente
Os fantasmas à solta
correm desabridamente,
arrancando árvores,
arruinando as casas,
estilhaçando os vidros das janelas.
Regressaram dos seus túmulos
de pedra os soldados mortos
e avançam sedentos e famintos,
espalhando sangue, mutilando corpos,
cuspindo impropérios à Grande Parideira,
Vida nua, Vida crua, Vida fria,
Vida voraz, Vida insaciável.
Vida, Furor de Diónisos,
Meio dia de Nietzsche,
Cansaço de Mim de Pessoa,
Promessa sempre adiada,
Desejo infindável de partir.
Os fantasmas à solta
correm desabridamente,
arrancando árvores,
arruinando as casas,
estilhaçando os vidros das janelas.
Regressaram dos seus túmulos
de pedra os soldados mortos
e avançam sedentos e famintos,
espalhando sangue, mutilando corpos,
cuspindo impropérios à Grande Parideira,
Vida nua, Vida crua, Vida fria,
Vida voraz, Vida insaciável.
Vida, Furor de Diónisos,
Meio dia de Nietzsche,
Cansaço de Mim de Pessoa,
Promessa sempre adiada,
Desejo infindável de partir.
Wednesday, June 25, 2014
Thursday, June 19, 2014
Ensinaram-me. O quê? Ao certo não sei.
Aprendi algo, contudo:
(Só sei que nada sei!)
O princípio da filosofia,
O princípio de tudo,
A medida de tudo,
Sou eu e a minha circunstância.
O infinito cabe na palma da mão,
Na algibeira aberta da parte de dentro,
Do avesso, onde pulsa o coração,
Que vive, sente, bate, é.
Agora e para sempre,
Alegria, medo, esquecimento, arte!
Tuesday, June 10, 2014
A Esperança Morreu em Lampedusa
A Esperança Morreu em Lampedusa
Vinham embarcados do outro lado do mar,
Traziam desejos e memórias.
medo, desespero e sonhos...
A morte encontrou-os em Lampedusa.
Quem resgatará os seus corpos,
que, iguais, sem dor, emudecidos,
aguardam as mãos da terra fria?
Sunday, May 18, 2014
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