Wednesday, November 14, 2007

Carta de um soldado à sua amada

São cinco e meia da tarde. O vento corre em torvelinhos. As árvores batidas pela tempestade jazem pelos campos. Volta. Ouço ainda o murmúrio do rio. Lá fora do outro lado de dentro, talvez encontres algum abrigo.
Tenho uma mão mutilada. Lembras-te? Foste tu numa noite de raiva e desejo. Acusaste-me do roubo do teu colar de contas prateadas, a única jóia que possuías. Apanhaste a tesoura do armário onde a tinhas escondido para que eu não a encontrasse e bateste e esfacelaste até que a minha mão se transformou num farrapo. Não te comoveste. Rias-te ainda.
Às escondidas mamavas da minha garrafa de whisky e choravas baixinho para que ninguém te ouvisse. Ninguém te ouvia. Excepto eu.
Amaldiçoei o teu nome e jurei destruir-te. Não encontro a paz.
Ontem parecias uma criança. Sentavas-te ao meu colo e querias brincar. Nunca precisei de te pedir nada. Davas-me tudo. Porque mudaste tanto? Não consigo compreender o que se passou naquela noite. Atraíste-te com os teus meneios de princesa-escrava judia. Abandonei-me a ti e foi então que traíste. Nunca soube muito de ti. É verdade o colar de contas prateadas?
Tento reconstruir a minha vida mas dói-me o absurdo. Não sei se és culpada ou se eu sou inocente. Procurei por ti em todos os bares e vi-te assomando a todas as janelas, cruzando-me contigo em todas as esquinas. Fui expulso do meu perfeito paraíso e abismado permaneço em ti. Gostava de te voltar a encontrar.

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